quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

breve pesar

Hoje, uma grande amiga minha me magoou de uma forma bem profunda. Talvez, tão absorta em “ensimesmismos” que esteja, demore ou chegue até a nunca perceber o que me fez. Portanto, aqui vai uma pequena reflexão sobre injustiça e perdão.

A injustiça é um entendimento latente que ainda não sabe que é um entendimento e que tenta passar por uma brecha que nossa autodefesa cometa. Perdoemos tamanha incoerência!

domingo, 24 de outubro de 2010

Poucas


De uns dias para cá, minha cabeça tem sido alvo massacrado por todas as minhas vicissitudes. Nunca imaginei que dentro de mim pudesse haver tanta contradição, tanto equívoco, tantas coisas foras do lugar. Mas hoje, em especial, um fato muito inusitado ocorreu. Lembrei-me de um texto que há muito tempo escrevi. Na verdade a lembrança não foi exatamente do texto em si, mas de suas entrelinhas. Eu decidi relê-lo e aqui o posto.

Poucas

Destino... Que coisa relativa!
Quantas pessoas reconhecem o valor oculto, aquele que pode ser até mesmo aquela unha que nunca inflama no dedo do pé?
Quantas vezes temos a coragem de pedir ao relógio para passar exatamente a hora do modo que ela tem que ser passada, sem nenhum atropelamento ou pausa?
Quantas canções a gente realmente canta sentindo-a, vibrando, nos pondo em cada verso, entoando cada sentimento escondido naquela melodia?
Quantas pessoas têm o dom de derramar o vinho, recolhe-lo e logo ir em busca de outro, mesmo sendo o derramado o mais caro da safra?
Quantas pessoas percebem a perfeição da rotina de acordar, comer, andar, cansar-se e dormir muito?
Quanta gente sente-se amada sem ser cem por cento completadas?
Quantas poses ridículas temos a ousadia de fazer para nós mesmos diante de um espelho pelo simples e completo prazer de fazer?
Quantas rosas dadas realmente são provas de amor e quantas pessoas reconhecem que o amor também tem espinhos?
Quantas pessoas possuem o olhar, aquele simples olhar que muda o curso do rio e quantas são capazes de perceber esse poderoso dom dos olhos?
Quantas poesias descrevem de fato o nosso tipo de amor e quantas poesias ainda restam no mundo?
Quantos de nós sonhou longe... alto... voando bastante, e quantas pessoas acordaram logo em seguida sem medo de realizar?
Quantas pessoas já descobriram que para sermos felizes com alguém, basta sermos felizes com nós mesmos antes de tudo?
Quantas pessoas agradecem intensamente pela brisa que acariciou a nossa face e levou consigo qualquer feição de mal humor?
Quantas simples pessoas cultivam a escassa fé que remove as montanhas, por mais pesadas que sejam, que soterram os sonhos?
Quantas pessoas possuem o dom de rir, o dom de fazer chorar, e dom de nos tocar mesmo sem um membro do corpo sequer?
Quantas pessoas sabem encontrar dentro do coração a receita para se fazer heróis na hora em que se precisa de um?
Quantas vezes surge em nós a capacidade de sentir, perceber e fazer algo de bom para nós?
Cada um de nós é um vento, um moinho, e um caminho.
Um moinho que se move conforme o vento.
Um caminho que nos dá chão até onde o vento quer nos levar.
E quantas pessoas sabem disso?
As mesmas que sabem o que é o vento.
Poucas


Iago Dzetell
30/09/07

sábado, 7 de agosto de 2010

Depois de você


Por longos anos a gente se acostuma.

A negligenciar o lugar vazio tão apavorante ao nosso lado;

A pensar no amor somente enquanto um verbo inconjugável na primeira pessoa no plural ou somente no futuro do pretérito;

A passar por cima da dor de perceber que preenchemos todos os buracos, mas só resta vazio o único que não somos nós quem preenche.

A relutar no eu e não pensar em nós;

Conformamo-nos em permanecermos sós.

A gente se conforma em crescer mesmo faltando uma única raiz, justamente a que pode pôr tudo abaixo por falta de equilíbrio.

Até que chega alguém e desestabiliza toda a nossa órbita.

Alguém... TINHA que ser alguém!

Tinha que ser O alguém.

É aí que o mundo todo gira em outra direção.

Arranca todos os alicerces podres do chão.

Reposiciona em força vulcânica novas setas para seguirmos e nem pergunta se é essa a direção que queremos.

Faz um estardalhaço tão brutal dentro de nós que por um período a gente estranha.

Estranhamos tudo dentro da gente. Tudo está tão diferente.

É como deixar a casa de um jeito e retornar com tudo reposicionado.

Depois que esse furacão passa, deixa um enorme rastro nem um pouco nocivo.

Bate uma necessidade urgente, imperdoável e desesperadora de acalentar a alma na companhia do outro.

Tudo fica infinitamente mais vago, frio , embaçado e potencialmente mais difícil quando o eu está longe do você.

Um, como um doce e bom vício, precisa do outro.

É quando o sol amanhece mais lindo por saber que você está no mundo,

Quando a natureza toda floresce em sua homenagem,

E quando Deus decide celebrar sua existência criando o amor.

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Subentendido


Algo entre o sim e o não.

Mistura perfeita de certeza, talvez e o amargoso nunca.

Hipótese, algo que apenas hipoteticamente ocorrerá.

Sendo tudo subentendido e hipotético, assim permanecerá perdido no tempo e sempre subentendido, algo que hipoteticamente teria ocorrido.

Mas subentendido por dificuldade de entender ou por medo do entendido?

Então permanecerá subentendido!?

Mergulhado no mar das hipóteses, afogando-se no subentendimento...

Vanessa Souza.

sábado, 24 de julho de 2010

Meu coração bate forte.
Mas que bater forte é este.
Sabe não sei se é amor.
A pouco não sabia que éramos.
Éramos mais que amigos.
Será que nascemos amantes?
Mas meu medo burro não me deixa.
Às vezes penso “idiota”!
Mas me vejo em beco.
E no meu perder.
Tenho medo de não te ter.
Fico aqui a pensar em você.
A querer você pra mim.
Não é por pena, ou motivo besta.
É por que te amo.
Que te quero aqui.
Perto de mim meu amor escondido.
Meu amor proibido – por mim?
Seria bom te dizer “te amo”.
Mas a vergonha me faz recuar.
Se talvez você percebesse.
Que te amo mais que a mim.
Que meu universo é você.
Ah meu amor tão meu.
Tão não meu tão distante e tão perto.
Queria dizer-te antes que me extinga.
Amo-te!

Ellielton Leite

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Há uma grande história, de entrelinhas macias e significados intensos prestes a receber a inicial maiúscula que inicia qualquer frase.
É hora de começar a escrever.

Miguel Iago Cavalcanti

sexta-feira, 23 de julho de 2010

Quase uma fábula de auto-descobrimento


Desavisadamente, percebo uns graozinhos de terra no chão.

Tão pequenininhos e sutis quanto a minha força. Olho-os com tamanho despercebimento que misteriosamente tudo começa a fazer um estranho sentido.

De onde eu vim para parar bem ali na frente? E por onde aqueles pontinhos de terra capengaram até esbarrarem em mim?

Com certeza temos alguma coisa a dizer um ao outro: algo que de antemão não se definiria por si só, mas que carregaria em si uma mensagem tão forte que abalaria potencialmente todas as minhas estruturas.

Eu, padecendo de um anacronismo de sentidos, prostrei os meus pés sobre esse caminho para que eles o percorram aos milímetros e façam valer a lei da ação-reação, que eu ande por esta terra e ela ande sob mim. Que percorra cuidadosamente os meus meandros, avalie as minhas saídas, meus muros e minhas tantas outras limitações. Coloquei-me nesse caminho calmo, bem longe dos meus aflitos, não para deixar de ouvi-los, mas para ver se eles se emudecem sozinhos. Não posso carregar mais companheiros do que a minha bagagem comporta, é desonesto para com minha coluna tão açoitada por pesos desnecessários. Vim rezando acima de meus limites esgotados de esperança para encontrar por este percurso algum posto de reabastecimento de fé. E tudo anda tão seco... tão seco que chega a me ressecar por dentro. Meu âmago vira a terra árida e quebrada do sertão esperando pela chuva.

Esta chuva veio na forma de você, pedaço de terra?

Se for, desvende-se pra mim, por favor! Eu sei que é presunçoso e sobretudo injusto com você querer seu desfecho antes dos prováveis clímaces, mas é que eu venho carregando uma sede de desfechos tão letais ultimamente. Meu infinito particular escafedeu-se para um desses limbos onde ficam as apatias. Perdi a esportiva sobre mim mesmo. Não tenho mais tempo a perder e nem tenho um motivo consistente de não ter mais porque não perder tempo. Se eu perdesse tempo minha vida faria mais sentido?

Ah, então você está aqui me fazendo perder tempo?

Se for... Perfeito! Obrigado mesmo! Eu estava precisado de verdade de uma vadiagem mental! Faz bem mesmo. Sinto-me novo em folha para qualquer nova coisa. Como seria a terra que Hitler viu antes de começar o holocausto? Seria da mesma matéria que a de Gandhi, enquanto ele pregava assiduamente a paz? Por que a reposta tem que ser um assustador sim? Por que tudo tem que ter um mesmo princípio e a gente que escolha o seu resto? Eu definitivamente não me sinto apto a fazer escolhas de direções. As minhas setas não param de girar, como saber para onde ir?

- Eu só estou aqui porque me desprendi da minha montanha, assim como você! Só parei aqui para lhe lembrar que minha essência é muito maior do que meu tamanho, também assim como você.

- Ué, migalhas de terra falam? Eu hein, vou é continuar andando!

...

quinta-feira, 22 de julho de 2010

ébrio

E, às vezes, como uma borboleta o coração se revela.

Como a areia da praia no vento.

Como uma dolorosa despedida de aeroporto.

Como um quadro perdido de metástase.

Como um estado crucial de apostasia.

O homem padece de uma gripe sinestésica a partir de então, seus sentidos enlouquecem.

Sente o amor com o faro, com as fotos, com o vento, com a ausência, com o choque, com os espinhos.

Repentinamente, o amor avança para um estágio tão nocivo... ganha a inebriante beleza das estrelas de nêutrons,que envolve por sua beleza, seu tamanho perolado, mas só quer que a levantemos pra sentir suas toneladas.

É nesse suspender estelar que tudo dói.

Dói saber que a pessoa existe.

Dói a certeza quase fulminante de que essa pessoa não te quer, de que ela não de deseja vivo da forma como você a deseja.

Dói desejar com todas as forças da palavra desejo.

Dói perceber que ela não te respira, não te vê, não te sente em todo o lugar como o sentido de tudo.

Dói tanto! É como se esmagassem todos os seus sonhos.

Dói como a dor de haverem desordenado as setas para as suas direções.

Dói como a dor de soterrar a fé, como a sensação de sentir o peso do mundo em seu peito.

É um martírio tão gostoso, uma vontade cega de querer vencer se perdendo...

É, definitivamente como uma borboleta.

Não há comparação mais perfeita.

Não há comparação mais indomável, mais impermanente, mais imprevisível e mais direta.

Quando você pousar em mim, esquecerei-me de todos os pesos de todas as estrelas que projetei.

Esquecerei o mar de melancolia transpassando em mim.

Esquecerei o frio apavorante de estar só mesmo com todo mundo.

Lembrarei de meus lábios úmidos, meu corpo molhado, meu semblante sereno, mas de predador, e dessa vontade alastrante que precisei emudecer por um momento de nos fazermos felizes,

Mas é só até você pousar em mim.

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Certa apaticidade

Por tanto tempo tenho vestido uma carcaça humana tão vulnerável e sufocante, que às vezes penso não conseguir nunca mais desgrudar meu corpo de minha aura. É como se estivesse preso em uma prisão da exata medida do meu corpo. Tudo tem um toque tão mais apático assim. Eu preciso me domar um pouco melhor, deve ser falta de adestramento – só pode! Pensar nos propósitos de existência deste jeito parece tão insípido: Atingir o nirvana soa como padecer de um infindável e abismático tédio; amar alguém me lembra mais os grilhões enferrujados e pesados de amordaçar escravos do que uma completa entrega recíproca de almas mutuas; se eu for o exemplo de todos, quem vai ser o meu exemplo?

Não, eu não nasci pra ser rei! Não nasci para ter tudo quanto minha ganância me obrigasse a ter com facilidade. Facilidade é palavra de vocabulários de frouxos, não sei se é tão legal assim comportá-la no dicionário pessoal de bolso. Também não nasci para a mendicidade. Nego do direito de precisar demais. Precisar demais é escorar-se. Embora todos os meus instintos apontem para o extremo, eu quero o meio. O meio que divide o ser forte do ser frágil, o ser gigante do ser minúsculo, estar entre o que oferece a mão e o que nela segura, anular as direções – sem esquerda ou direita – Abster-se de qualquer felicidade sufocante, que de tão grande asfixia, e de qualquer sedutora melancolia.

sábado, 3 de julho de 2010

Polêmica da Masturbação

Ui, masturbar-se é pecado! É pecado porque a gente se viola.
Por que se auto-sabotar é tão gostoso?

Contemplando Lispector ou Meu Momento Lispector ou Vomitar de um Anjo.

Era um dia comum. Era um dia tão comum que dava preguiça de ser um dia assim, tão comum, mas mesmo assim o era. Eu estava esperando o ônibus em direção à universidade: mais um dia. E com que desânimo eu pensava nisso: mais um dia. Assim que o motorista abriu a porta de embarque, todos os passageiros rapidamente se ocuparam em preencher os assentos do veículo. Uns conseguiram sentar enquanto outros tiveram que passar a viagem em pé pela falta de cadeiras. Definitivamente estava tudo normal. E eu gostava dessa normalidade como algo que não me ofende e não me desafia. Eu gostava de admirar o igual para perceber todas as nuances quase imperceptíveis de se ser igual. Assim o fiz. Com a cabeça debruçada sobre o vidro na janela, eu conseguia observar o que se passava dentro e fora do ônibus. Admirava as paisagens, mesmo sendo todas já conhecidas e praticamente decoradas pelas incontáveis vezes que eu já havia feito o percurso. Admirava simplesmente por admirar, sem querer nada em troca dessa admiração. Eu estava tão feliz admirando o cenário de graça... é que eu nunca consegui muito bem admirar o meu interior de graça, então me bateu a felicidade de reconhecer que eu tenho a capacidade de admirar de graça, mesmo não tendo tanto controle dessa capacidade.

Distraído em meus nós de pensamentos, lembrei que na minha bolsa estava o livro que eu lia na ocasião, A Descoberta do Mundo, da minha querida Clarice. Caramba, como eu quis ler esse livro! Eu não tenho muito o hábito de ler livros. Pra me fazer ler, o livro tem que me seduzir em cada folha. Quando isso não acontece, não há nada mais torturante e enfadonho pra mim. E essa sedução deve, sobretudo, começar pelo nome. Clarice tem o dom de me seduzir. Ela tem o tempero que me agrada: uma voraz capacidade de entender o mundo, o que não quer dizer uma voraz capacidade de explicar o mundo. Eu adoro pensar no que passava pela mente dela enquanto ela construía suas frases: pensar naquele bico engraçado que ela fazia pra falar, se tinha algum cigarro na mão – Acho isso tão cafona e charmoso, herança da beleza européia – ou se estava escrevendo com a máquina de escrever em seu colo – Que posição linda para se escrever, é tão seminal.

Enfim, à parte minha descarada tietagem por Clarice, voltando à história, eu pus a mão dentro de minha bolsa e retirei o livro. A parte onde havia parado estava marcada pela orelha interna da capa do livro, que por sinal estava toda amassada. Eu e minha mania de marcar páginas assim... que vexame, o livro era emprestado da biblioteca. Eu odiava devolver livros piores do que quando me foram emprestados. Eu estava no meio do livro, o que faz pouca diferença tendo em vista que era um livro de crônicas e eu nunca lia na ordem do livro, saia pulando uns e voltando a meu bel-prazer. Achei a página e saí procurando algum título que me agradasse. Foi quando eu achei algo interessante e comecei a leitura. Ler Clarice, para mim, é como estar realizando o sonho de abraçar o mundo. Ela consegue fazer coisas micro parecerem monumentais – Leiam um conto dela chamado “O Ovo e a Galinha”, ela passa o conto inteiro descrevendo um ovo. Como eu queria ser esse ovo – do mesmo jeito que consegue fazer simples situações ganharem aspectos astronômicos, eu diria. Ela sempre tem um bom conselho pra me dar, o qual eu faço questão de ouvir com o máximo de intensidade que eu conseguir dar à palavra atenção.

Eu estava muito ocupado destrinchando Lispector no ônibus. É muito bom ler no ônibus. Uns dizem que não faz bem, mas eu continuo dizendo sem pudor o quanto isso me agrada. O mundo parece se abster de qualquer direção, a viagem se anula pra mim. Tanto que eu mal havia posto os olhos no livro, a minha parada já estava se pressagiando. Que raiva, iria ter que deixar minha queridinha pra depois. Uma parada antes eu fechei o livro e o guardei na minha bolsa. Engraçado... eu havia visto que muitas pessoas estavam em pé por falta de lugares para sentar, mas não tinha percebido que o lugar ao meu lado estava ocupado por uma mulher. Que desleixo, Miguel! Constrangido pelo particular incidente, eu me refaço e termino discretamente de fechar a bolsa, e a mulher me pergunta com uma cara de preocupação educada:

- Perdão, mas este ônibus está indo para o Hospital das Clínicas?

Gente, que educação sublime! Eu absolutamente não acredito que ela foi educada a ponto de só me perguntar isso agora, quando eu tinha desistido da leitura. Possivelmente ela tomou o ônibus errado – isso eu iria conferir já já – mas o caminho que diferencia um ônibus do outro já se passava fazia uns 5 minutos, ou seja: devia ter pra mais de 5 minutos que ela estava nesse dilema. Se fosse comigo, eu, que respeito muito a literatura e, sobretudo, quem lê, já teria perdido a educação há tempos e rompido a leitura. Quem é que respeita um livro hoje em dia? Foi-se a época, e foi-se à muito tempo mesmo, em que um livro era devidamente respeitado. Muito menos em uma situação de dúvida – Ela estava querendo saber se o ônibus estava indo para o hospital! Possivelmente tinha algum problema de saúde, ou iria visitar alguém por lá. Levar alguém, ela não ia, pois estava sozinha.

- Ih, eu acho que a senhora confundiu o ônibus! Este não só não passa como arrodeia muito – Realmente o nome dos ônibus era muito parecido.

- Ai meu Deus! E como é que eu faço pra chegar lá?

Achei tão fofa a educação até mesmo pra se desesperar, que se tornou questão de honra salvar a dama daquele impasse. Eu estava muito grato por ela ter permitido que eu lesse o quanto eu quisesse de Clarice, minha grande escritora, e sentir uma necessidade urgente de retribuir isso. Mas como? O que eu podia fazer? Foi quando eu e minha geminianice rapidamente ligamos o nome ao lugar: O hospital em questão era o Hospital das Clínicas, o hospital da minha universidade. Então eu precisaria mostrar o caminho para ela.

- A senhora pode descer comigo! Esta vai ser a última parada mais próxima à universidade. Eu lhe mostrarei o caminho interno até a senhora chegar lá, não será difícil.

- Poxa, obrigada!

Quando ela me agradeceu e se levantou comigo para descer, eu involuntariamente liguei essa situação a um conto de Clarice chamado “Mal-estar de um Anjo”, se eu não me engano é esse o nome. Não lembro bem porque faz muito tempo que li, mas neste conto, Clarice se sente mal por ter recebido a gratidão de alguém que ela ajudou. Na ocasião eu fiquei me perguntando o porquê de ela haver se sentido incomodada, mas eu me flagrei na mesma situação que ela. Não entendi o porquê do mesmo jeito, mas estava sentindo do mesmo jeito. Contive-me em apenas sentir o que Clarice uma vez sentiu. Senti-me honrado por, mesmo depois de uns 30 anos no mínimo do mínimo, estarmos partilhando de um mesmo sentimento inóspito. Senti nossas almas em congruência. Senti uma felicidade constrangida e tímida, mas abençoada.

Assim que descemos do ônibus e entramos na universidade, minha cabeça estava freneticamente estudando a melhor explicação para dar a ela, e com toda a gentileza possível. Eu estava quase imprimindo um mapa e entregando a ela. O caminho só era conhecido por quem já estava acostumado no campus universitário. O departamento de medicina ficava muito distante do departamento de música. Por mais que eu tentasse, eu não iria conseguir fazê-la chegar ao seu destino a tempo de se sentir satisfeita comigo. Não havia muito que fazer.

- Veja, se a senhora for por aqui em frente – e apontei para a frente – Vai dar na Biblioteca Central. Chegando lá, a senhora estará mais perto. Depois, passará por uma pontezinha – Pontezinha? Que ridículo! – É só olhar pra baixo da ponte que vai ver água passando – Caramba, essa foi deprimente – aí, quando a senhora passar da ponte, a senhora vai estar bem mais perto. É só perguntar! Com certeza alguém vai lhe explicar! – meu Deus, eu confiei em estranhos uma tarefa somente minha! – é só entrar pra cá – E apontei para a esquerda. Eu não falei esquerda porque me confundo muito com esquerda e direita pra raciocinar rápido o que falar. Por isso, preferi apontar, me perdoem.

Ela acompanhava anotando tudo com os olhos a minha imperdoável instrução.

- Para a esquerda?- confirmando

- Isso! – que bom que ela entendeu!

- Obrigada! Bom dia!

Nossa, ela disse isso de novo? Disse “Obrigada”? Pra isso?

Eu nunca senti um obrigado com tanto remorso. Caiu como um saco de chumbo no estômago. Eu estava envergonhado pra continuar na presença dela, eu queria retirar minha cara e jogar em qualquer canto até ela sair do meu campo de visão. Como eu pude soar tão desimportante para uma pessoa tão doce? Que decepção, Miguel, que decepção! Eu estava muito desapontado comigo mesmo pra querer ouvir qualquer réplica que eu quisesse me fazer. Não queria me ouvir e pronto.

- Bom dia para a senhora também!

Ela deve ter se sentido uma velha pela quantidade de vezes que eu a chamei de senhora, mas acreditem que foi por puro respeito, somente!

Mesmo com um remorso de baleia pesando em mim, observá-la indo ao destino que eu ensinei me soou como uma recompensa. Seus passos estavam engraçados. Ela andava desengonçadamente rápido. Quando a perdi de vista, retomei minha monotonia com certo desgosto, mas agradavelmente. Virei e recuperei a direção para o meu departamento. No curtíssimo caminho, me veio à mente a imagem de Lispector. Será que foi uma sabotagem dela pra mim? Será que foi uma aula de como ser humano dela pra mim? Independente da finalidade, com certeza tinha um quê de Clarice nessa situação.

Eu vivi uma epifania.

Não sou mais o mesmo!

terça-feira, 29 de junho de 2010

Ponderações sobre sentir...




Há uma dádiva muito grande em sentir um desejo. Cada pedaço, ou sequer resquício, vem dotado de uma delicadeza de sabor inebriante. Os sentidos se anestesiam, como se fizessem fusão nuclear em meio a um grande cataclismo de fragrâncias... direcionando toda a energia a um único propósito apoteótico: sentir. Sentir com o sentido de dominar, abrigar dentro de si tudo quanto o corpo, num delicioso êxtase, clama por devorar. Pede com tamanha urgência que toda a atmosfera humana se expande a um estado irremediável de abstinência. E assim.. com todas as moléculas dotadas de uma avareza apocalíptica, montam em um fugaz instinto até a saciedade.
Que vontade... que vontade!
Eu quero!

domingo, 27 de junho de 2010

Tijolo por tijolo


Estou me considerando podre.
Alguém dotado de um pateticismo interno. Maldita (ou bendita?) condição humana: nada em mim me interessa (?). Uns blocos da gente parecem mais punições do que, de fato vida, e é isso que me incomoda: onde foi que eu deixei a fé? Eu tinha certeza de que estava por aqui... mas onde foi que eu deixei?
Sentado e fadado, apoiando a cabeça com o meu pescoço, apoiado por meus ombros morrendo de medo que a simetria se desmanche, exerço o grande dom humano de ponderar. Mais que isso: Exerço o grande dom humanóide de ponderar no vazio.
Afinal... em que hei de pensar?
Em como as minhas rugas estão latentes e quando tocando a superfície de minha epiderme? Pensar em como admiro minha bagunça interna por ser milimetricamente posicionada e mesmo assim não deixam-na de dar o nome de bagunça? Em como eu tenho uma urgência de ser feliz, que se transforma no erro de ser feliz? Em como eu exponho meus defeitos me tornando vulnerável à picada de insetos?
...
Sabe o que acontece aqui? É que a vida me deu o incrível presente da desconstrução.
E me considerarei feliz por isso!

segunda-feira, 21 de junho de 2010


Eu prometi a mim mesmo não escrever sobre sentimentos menores, aqueles que injetam altas doses de ilusão na corrente sanguínea. Já prometi não comentar coisas que me afetem, que me sufoquem, que me paralisem. Também prometi ser um guerreiro que luta, mesmo completamente aniquilado pela perda. Prometi esconder fatos de mim, pedindo pra outras pessoas esconderem. Prometi me jogar ao amor da cabeça aos pés... errei? Prometi não ter medo de ajoelhar e orar pra que não ocorra nada que não tenha que ocorrer. Jurei que eu distribuiria o perdão para todos que incondicionalmente precisassem. Prometi que gostaria pra sempre de tanta coisa... de tantas pessoas... Prometi não ser mais esse bando de defeitos... mas o que acontece se eu não for isso? Prometi que iria a algum lugar que não sei bem qual é só pra sair da situação: Prometi ir alí e voltar logo. Prometi exercer o orgulho de não chorar mesmo morrendo de vontade. Prometi não me aborrecer mais pensando no que poderia ter sido e correr atrás do que ainda pode ser. É, eu já prometi esquecer o inesquecível, arrancar o que não desgruda, tentar vencer o que não aceito que perdi. Que vergonha, eu prometi jamais dizer "eu te amo" em vão...
Por trás de todas essas promessas... o que eu realmente queria?
-Eu não sei.
Mas estranhamente, estou muito feliz em saber que eu não sei.

quarta-feira, 31 de março de 2010

Jogando fora


Era uma formiga no fundo de uma lixeira. Estava completamente soterrada por grandes sacos abarrotados de restos de alguma coisa muito suja e fedida, lacrados improvisadamente como se nem tivessem levado a menor atenção por quem os pôs ali simplesmente por tratar um lixo como um lixo. Aquele lugar era um desejo imundo. Um lugar onde não havia espaço nem para um fóton entrar... já que as sacolas não permitiam tal façanha. A gravidade fazia questão de tornar tudo bem mais pesado, puxando mais ainda para baixo, retraindo mais ainda para baixo. E lá estava a formiguinha. Tão caída... tão fraca e debilitada que dava um dó enorme. Mas não nos deixemos enganar. Ela está lá por querer. É rabugenta demais para aceitar ajuda. Se julga Adulta como quem se julga Deus. Ao mesmo tempo, sempre foi inquieta demais para auto-imprimir desafios. Sua imagem estava sim, de fato, quebrada. No fundo daquela lixeira, soterrada em tanto lixo, ela parecia mais um lixo. Acho que a formiguinha deve ter se jogado lá sem perceber que o barro estraçalhado realmente era ela. Era realmente pedir demais para uma formiga se diferenciar de um lixo? Ali, parecia padecer de todos os pecados e sentindo o efeito de uma injeção letal de apatia. Suas patinhas quebradas representavam um gesto de pena tão poderoso que não havia como ela se erguer novamente. A fome já devia ter comido boa parte de seu organismo e de seus sentidos. Fazia tempo que não admirava o céu.... tanto que nem lembrava qual era a cor que ele tinha; Quais as nuances que as núvens reproduziam. Por um segundo, ela imaginou que era possível olhar para cima e ver a face de Deus. Sorriu de um sorriso tão esperançoso quando lembrou-se disso. Foi quando algo surpreendente aconteceu. Um feixe tímido de luz incidiu bem na frente de sua face. Que susto! Mas é verdade, Olha ele bem ali! Se a luz está ali, então resta uma saída.... Resta Uma Saída, RESTA UMA SAÍDA! Se os olhos não estivessem tão preocupados em se manterem ali, ajudando no equilíbrio da cabeça para não ser esmagada pelos dejetos, com certeza chorariam. A formiguinha só precisaria sair dali. Avaliou a situação e chegou à conclusão de que não conseguiria. Relutou... relutou... até que percebeu que sua cabeça não doia pelo peso insuportável dos sacos de lixo: era a sua vontade que gritava... a um ponto que chegava a ensurdecer. Se baseando mais na vontade de querer se calar do que querer sair, esboçou um plano de fuga bem simples: reconhecer suas possibilidades. Por sinal... quais seriam estas? ... Bem, umas pernas quebradas e uma cabeça espremida não são grandes triunfos. Não, de fato. Muito menos acompanhados de uma resistência murcha. Foi quando a formiguinha lembrou-se de que por ela ainda passava o sopro da vida; o capaz de dar vida à qualquer coisa, até mesmo à que ainda está viva, mas já morreu.Compadeceu-se de si mesma, resolveu inflar-se... crescer até onde ela mesma pudesse ir, talvez bem além do seu limite.Resgatou-se de lá e foi saindo, com a mesma feição de quem sai da toca e sente o sol. Foi emergindo a curtos passos... Talvez tão curtos que pareceriam insignificantes, mas donos de uma perseverança digna de aplausos emocionados. Quando finalmente se afincou na superfície, pôde perceber o quanto tudo o que estava abaixo dela era lixo e o quanto o céu estava azul. Olhou para si mesma em sinal de auto-contemplação e percebeu que , a partir daquele momentos, era uma formiga no fundo de uma lixeira.

(Perdoem os erros... é que eu escrevi ROXO DE SONO!)

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Mensagem


Se Deus se materializasse na minha frente como algo concreto, eu o ouviria procurando sentir cada centímetro de seus olhos. Se ele fosse uma mata fechada, eu entraria sem medo como quem sabe o que está por vir, e titubeante como quem tem medo de fitar os pés no chão. Eu olharia cada vestígio de pegadas como quem se sente seguro por não ser o primeiro, e temeroso por estar só. Se ele fosse o céu.. e eu sei que ele é... eu o admiraria, e como! Por ser grande... por estar acima de mim e me deixar protegido, por fazer chover quando eu precisar esfriar a cabeça, por deixar o sol me instigar, por deixar eu prever a forma das núvens, por fazer com que a lua se esconda atrás das núvens quando eu estiver enfeitiçado por ela, por me transcender toda a vez que respiro o vento.
Se Deus se materializasse na minha frente, eu agradeceria pela mensagem revirada de linhas ocultas.
Obrigado... Muito Obrigado.

sábado, 23 de janeiro de 2010

Fragrância



Entre as conversas de urubus que planavam sobre o meu céu, percebo a fragrância de conversar voando, mesmo sendo um urubu. Olho para cima, com a cabeça desenhando levemente o percurso da subida, e procuro sentir a fragrância das nuvens (Elas também encobrem o meu céu?) oculta em suas formas e peculiaridades. Se alguém cortasse a corda... como seria ver as nuvens despencando?

É tão bom sentir o gosto que o cheiro tem. Perceber por minhas narinas o mundo.. sentir ele entranhar em meus sentidos.. correr por minhas veias respiratórias como uma comunhão de sangues. Sentir o sabor que a natureza tem deveria ser um merecimento para poucos. Se eu inspirasse como toda a força.. o mundo todo caberia nos meus pulmões?

Feche os olhos.. tranque a boca... cerre os ouvidos... e respire. Respire como quem se sente entrar em um estado de budeidade; Como quem precisa decorar todas as linhas do corpo humano com o nariz; como quem quer se embriagar na essência que o mar tem... e que seus perigos também. Deguste a emanação das idéias percorrendo em um sopro leve, simples. Um sopro que te abrace e te prenda. mas mesmo assim, não se sinta acorrentado. Mas se você se sentir assim... apele para o som da inalação. Deixe isso te acalmar.

Atinja o nirvana de sentir o cheiro de tudo que há no mundo.

O cheiro de chorar...

A essência de tocar sem nenhuma parte do corpo...

A fragrância de querer...

Xxxxxx....

Sssssssss...

Vvvvvv.....

Ffffffff.....

mmmmmmm....

Iago J. Dzetell